terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

e eu acorrentada para sempre no teu peito





















guarda-me
adormecida para sempre no teu peito

ou deixa-me voar uma vez mais sobre
esta terra de ninguém onde morro
por qualquer coisa que me fale de ti

há noites assim em que o silêncio
se transforma ao de leve numa lâmina
que minuciosamente rasga o linho
onde ficou esquecido o corpo que habitámos
em provisórias madrugadas felizes

depois é só abrir os braços e acreditar
que ainda faltam muitas horas para a partida
e que à-toa pelos corredores ainda escorre
uma razão primeira a trazer-me de volta

e eu adormecida para sempre
no teu peito

e eu acorrentada para sempre
no teu peito

e de novo entre nós aquele choro de quem
não teve tempo de preparar a despedida
com as palavras certas
porque as palavras certas estavam todas
em histórias erradas
que outros escreveram em lugares nublados
que nem vale a pena tentar recompor

muito ao longe uma voz desgarrada
estabelece o fim do verão

e eu adormecida para sempre
no teu peito

e eu acorrentada para sempre
no teu peito



Alice Vieira